O ROMANTISMO E O CONCÍLIO VATICANO II

Por Anatoli Oliynik

Esta breve análise procura mostrar que o Romantismo penetrou no Concílio Vaticano II (CV II) e plantou suas sementes gnósticas parasitando a Santa Igreja Católica Apostólica Romana começando pela Santa Missa e culminando na divisão dos fiéis em dois grupos: os que procuram mostrar que o CV II estava parasitado, embora não deva ser condenado ipsum totum, e os que não aceitam este fato.

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O autor toma por base a tese de doutoramento do prof. Orlando Fedeli sobre “Romantismo, Cabala e Esoterismo”, aprovada pela USP, em 1988, a Carta Encíclica do Sumo Pontífice PIO X “PASCENDI DOMINICI GREGIS sobre as doutrinas modernistas” e a vídeo-aula “Aspectos Gerais do Romantismo” da professora doutora Ivone Fedeli publicada no website “MONTFORT Associação Cultural”, em 2011.

Comecemos esclarecendo o Romantismo:

“O Romantismo não tem dogma, nem princípio, nem objetivo, nem programa, nada que se situe dentro de um pensamento definido ou de um sistema de conceitos (…). O Romantismo é uma atitude vital de índole própria e nisso reside a impossibilidade de determinar conceitualmente a sua essência” (Nicola Hartman. A Filosofia do idealismo alemão. Lisboa, Gubelkian, 1983, pp. 189-190).

“O Romantismo representa o desejo de ressacralizar a vida, a tentativa de edificar uma nova Fé que fosse capaz de substituir o catolicismo tradicional” (GUSDORF, Le Romantisme, Payot Paris, 1993, p. 657)

A doutora Ivone Fedeli faz um alerta para aquelas pessoas que imaginam que o romantismo não passa de um gênero literário escolar, uma relação amorosa ou um estado de espirito:

“É preciso estudar o Romantismo no seu aspecto doutrinário. Na verdade, o romantismo é uma escola de pensamento muito mais ampla do que se possa imaginar. (…) O Romantismo está na gênese do marxismo e na gênese do nazismo, bem como na origem do modernismo. (…) O Romantismo é uma doutrina que estendeu sua influência a todas as esferas do pensamento”.

Para mostrar que o CV II estava parasitado pelo Romantismo, irei ater-me a um único ponto que aparece na Santa Missa da Igreja Católica, comparando a Missa de São Pio V (papa 1566-1572), conhecida entre nós como Missa Tridentina, e a Missa de Paulo VI (papa 1963-1978), produto do modernismo introduzido pelo Concílio Vaticano II (1962-1965).

Na Missa Tridentina depois do Glória (ou depois do Kyrie, quando não há Glória), o sacerdote volta-se para o povo dizendo:

“Dominus vobiscum” [O Senhor seja convosco]

Desejando a mesma benção ao sacerdote, o povo, ou, o coroinha em nome do povo responde:

“Et cum spiritu tuo” [E com vosso espírito]

Esta piedosa saudação repete-se várias vezes na Santa Missa, entre o sacerdote e o povo, como que para se animarem mutuamente a perseverar no fervor.

Já na Missa Nova – a encomendada por Paulo VI – o “Et cum spiritu tuo” foi traduzido como:

“Ele está no meio de nós”.

A respeito desta expressão, a doutora Ivone Fedeli levanta a seguinte questão:

“Essa tradução esquisita “Ele está no meio de nós”, poder-se-ia entender como “Ele está entre nós”, mas não é isso, pois vendo a direção que tomou essa teologia da missa, encomendada e criada por Paulo VI, é de se perguntar se as pessoas que fizeram essa tradução tão esquisita se elas estavam querendo dizer “Ele está entre nós”, porque “no meio de nós” é a palavra que os românticos usam tecnicamente”.

O prof. Orlando Fedeli em sua tese de doutoramento explica o que os Românticos pensam e como esse pensamento se relaciona com a Missa Nova de Paulo VI:

“Deus, o universo e o homem não teriam apenas uma correspondência poética. Entre eles haveria muito mais: haveria uma certa identidade substancial na medida em que o espírito divino – o Espirito Santo – está ao mesmo tempo, em Deus e também no cosmos e no homem, como um germe em vias de se desenvolver. Nesse sentido é que os românticos diziam que Deus era o ‘Centro’ (Zentrum), o ‘meio’ (Mitte) o ‘coração’, o ‘núcleo’ (kern), do homem e da natureza. Daí a Missa Nova de Paulo VI – pelo menos na tradução em português, quando o sacerdote diz: ‘O Senhor esteja convosco’, o povo proclama: ‘Ele está no meio de nós’. No meio, isto é, em Mitte, no Centrum de nós”.

E prossegue:

“E os que fizeram essa tradução esdrúxula do ‘Et cum spiritu tuo’ [E com vosso espírito] podem muito bem se escusar lembrando que na Constituição Gaudium et Spes se diz:

“Por isso, proclamando a vocação altíssima do homem e afirmando existir nele uma semente divina, o Sacrossanto Concílio oferece ao gênero humano a colaboração sincera da Igreja para o estabelecimento de uma fraternidade universal que corresponda a esta vocação” (Concílio Vaticano II, Constituição Gaudium et Spes, n.º 3).

“… essa idéia, exposta na Gaudium et Spes, mais do que corresponde, é idêntica ao que expunha a Gnose romântica:

“O fragmento 41 das Ideen evoca a necessidade de um contrapeso espiritual à Revolução, que cada um deve encontrar em si mesmo: assim o centro de equilíbrio de toda verdade se situa no espaço interior; todo movimento ‘deve vir do centro’, indica o fragmento 50. O centro é o lugar privilegiado a partir do qual se exerce a visão religiosa do mundo: ‘a religião é a força centrípeta e centrífuga no espírito humano e o que liga os dois (…). A determinação do Centro, expressão de uma nova economia espiritual, põe em causa a vocação de cada homem para a humanidade” (G. Gusdorf. “Du Néant à Dieu dans le Savoir Romantique”, p. 311)

“A coincidência vai até a expressão vocação do homem à humanidade…”

A professora Drª Ivone complementa:

“Por este texto é possível perceber o quanto de influência que o modernismo teve no Concílio Vaticano II e na Missa Nova – o grande meio de difusão da doutrina do Concílio entre o povo Católico”.
“A essência do romantismo é: “Tudo é um”. Rebaixar o que é elevado e elevar o que é baixo, colocando tudo no mesmo nível. Em outras palavras: sacralizar o profano e tornar profano o sagrado. O objetivo final do romantismo é essa divinização do homem.”
“Ao contrário da Doutrina Católica que diz que ‘a revelação é feita por um Deus que é exterior ao homem no universo, e, portanto extrínseca, os românticos vão dizer com os modernistas que ‘a revelação é interior ao homem’ e que ela não é só revelação do homem a Deus, como também a revelação do homem ao homem, porque o homem vai saber o que ele é quando ele se descobrir como Deus”.

E finaliza:

“É uma pena que João Paulo II, que acaba de ser beatificado, diga que Cristo é o novo Adão. Lamentavelmente ele escorregou pela ladeira do romantismo (gnose) quando escreveu Redemptor Hominis n.º 8:

REDEMPTOR HOMINIS n.º 8: “Cristo que é o novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu Amor, revela também plenamente o homem ao mesmo homem e descobre-lhe a sua vocação sublime.” (itálico do original)

“Infelizmente essa expressão de revelar o homem ao homem é tipicamente romântica e tipicamente gnóstica. Não devemos esquecer que o papa João Paulo II teve uma profunda influência dos poetas românticos eslavos”.

A Missa de Pio V nunca foi proibida pela Santa Sé, mesmo depois do Concílio Vaticano II, todavia, no Brasil, os bispos ligados à CNBB – o núcleo comunista da Igreja no Brasil – simplesmente a aboliram. Vejamos um depoimento de Júlio Fleichman, presidente da “Permanência” durante trinta e cinco anos:

“A missa é o resultado místico de uma obra mística, de grandes místicos. Primeiro do próprio Jesus e depois os ritos surgiram de grandes místicos da Igreja, que foram, primeiro, os apóstolos, todos santos, depois grandes Papas santos e grandes doutores santos – com isso foi se formando a missa que tem, se não na sua integridade, pelo menos na sua essência, dois mil anos. E quando começaram a aparecer variações que punham em risco a pureza daquele ato litúrgico, o Concílio de Trento, no século XVI, estabeleceu as normas que a missa deveria seguir e o Papa, São Pio V, publicou uma encíclica famosa, chamada Quo Primum, proibindo que se fizessem modificações na missa dali para frente, coisa que os progressistas de Roma de nosso tempo não admitiram, e disseram que, se um Papa proibiu, o outro Papa, que tem poder igual, pode ‘desproibir’, e então fabricaram a missa de Paulo VI, que é essa que está aí.”

“Quando compreendemos que a missa nova era insuportável, começamos [Júlio, Gustavo Corção e outros] a procurar padres que nos dissessem a missa tradicional (…) até que descobrimos um padre holandês com quem fui conversar. Sentei-me ao seu lado no banco da Igreja e perguntei: ‘Padre, me diga uma coisa, o senhor acha que está proibido dizer a missa tradicional da Igreja? E ele me respondeu que não, que não podiam proibir a missa. Então, eu pedi ao padre que dissesse a missa para nós e ele aceitou. Tínhamos a missa na capela de umas freiras carmelitas, ao meio dia. E nós passamos cerca de quatro anos de felicidade tranqüila, porque para nós isso era o principal da nossa vida. Depois, perdemos a missa, porque uma das freiras nos denunciou e o cardeal mandou proibir. O padre holandês recebeu a proibição e ficou apavorado, com medo de o cardeal manda-lo de volta para a Holanda, e se recusou a continuar com aquela missa.”

O problema não é novo. O Papa Pio X por meio da Carta Encíclica “PASCENDI DOMINICI GREGIS” publicada em 8 de setembro de 1907, no quinto ano de seu pontificado, já alertava todo o povo Católico de que os inimigos da Santa Igreja Católica Apostólica Romana provinham, também, de dentro da própria Igreja.

Embora um pouco longa, transcrevemos a “Introdução” da “Pascendi” para relatar que a crise é grave e é de fé.

INTRODUÇÃO: “A missão, que nos foi divinamente confiada, de apascentar o rebanho do Senhor, entre os principais deveres impostos por Cristo, conta o de guardar com todo o desvelo o depósito da fé transmitida aos Santos, repudiando as profanas novidades de palavras e as oposições de uma ciência enganadora. E, na verdade, esta providência do Supremo Pastor foi em todo o tempo necessária à Igreja Católica; porquanto, devido ao inimigo do gênero humano nunca faltaram homens de perverso dizer (At 20,30), vaníloquos e sedutores (Tit 1,10), que caídos eles em erro arrastam os mais ao erro (2 Tim 3,13). Contudo, há mister confessar que nestes últimos tempos cresceu sobremaneira o número dos inimigos da Cruz de Cristo, os quais, com artifícios de todo ardilosos, se esforçam por baldar a virtude vivificante da Igreja e solapar pelos alicerces, se dado lhes fosse, o mesmo reino de Jesus Cristo. Por isto já não Nos é lícito calar para não parecer faltarmos ao Nosso santíssimo dever, e para que se Nos não acuse de descuido de nossa obrigação, a benignidade de que, na esperança de melhores disposições, até agora usamos.
E o que exige que sem demora falemos, é antes de tudo que os fautores do erro já não devem ser procurados entre inimigos declarados; mas, o que é muito para sentir e recear, se ocultam no próprio seio da Igreja, tornando-se destarte tanto mais nocivos quanto menos percebidos.
Aludimos, Veneráveis Irmãos, a muitos membros do laicato católico e também, coisa ainda mais para lastimar, a não poucos do clero que, fingindo amor à Igreja e sem nenhum sólido conhecimento de filosofia e teologia, mas, embebidos antes das teorias envenenadas dos inimigos da Igreja, blasonam, postergando todo o comedimento, de reformadores da mesma Igreja; e cerrando ousadamente fileiras se atiram sobre tudo o que há de mais santo na obra de Cristo, sem pouparem sequer a mesma pessoa do divino Redentor que, com audácia sacrílega, rebaixam à craveira de um puro e simples homem.
Pasmem, embora homens de tal casta, que Nós os ponhamos no número dos inimigos da Igreja; não poderá porém, pasmar com razão quem quer que, postas de lado as intenções de que só Deus é juiz, se aplique a examinar as doutrinas e o modo de falar e de agir de que lançam eles mão. Não se afastará, portanto, da verdade quem os tiver como os mais perigosos inimigos da Igreja. Estes, em verdade, como dissemos, não já fora, mas dentro da Igreja, tramam seus perniciosos conselhos; e por isto, é por assim dizer nas próprias veias e entranhas dela que se acha o perigo, tanto mais ruinoso quanto mais intimamente eles a conhecem. Além de que, não sobre as ramagens e os brotos, mas sobre as mesmas raízes que são a Fé e suas fibras mais vitais, é que meneiam eles o machado.
Batida pois esta raiz da imortalidade, continuam a derramar o vírus por toda a árvore, de sorte que coisa alguma poupam da verdade católica, nenhuma verdade há que não intentem contaminar. E ainda vão mais longe; pois pondo em obra o sem número de seus maléficos ardis, não há quem os vença em manhas e astúcias: porquanto, fazem promiscuamente o papel ora de racionalistas, ora de católicos, e isto com tal dissimulação que arrastam sem dificuldade ao erro qualquer incauto; e sendo ousados como os que mais o são, não há conseqüências de que se amedrontem e que não aceitem com obstinação e sem escrúpulos. Acrescente-se-lhes ainda, coisa aptíssima para enganar o ânimo alheio, uma operosidade incansável, uma assídua e vigorosa aplicação a todo o ramo de estudos e, o mais das vezes, a fama de uma vida austera. Finalmente, e é isto o que faz desvanecer toda esperança de cura, pelas suas mesmas doutrinas são formadas numa escola de desprezo a toda autoridade e a todo freio; e, confiados em uma consciência falsa, persuadem-se de que é amor de verdade o que não passa de soberba e obstinação. Na verdade, por algum tempo esperamos reconduzi-los a melhores sentimentos e, para este fim, a princípio os tratamos com brandura, em seguida com severidade e, finalmente, bem a contragosto, servimo-nos de penas públicas.
Mas vós bem sabeis, Veneráveis Irmãos, como tudo foi debalde; pareceram por momento curvar a fronte, para depois reerguê-la com maior altivez. Poderíamos talvez ainda deixar isto desapercebido se tratasse somente deles; trata-se porém das garantias do nome católico.
Há, pois, mister quebrar o silêncio, que ora seria culpável, para tornar bem conhecidas à Igreja esses homens tão mal disfarçados.
E visto que os modernistas (tal é o nome com que vulgarmente e com razão são chamados) com astuciosíssimo engano costumam apresentar suas doutrinas não coordenadas e juntas como um todo, mas dispersas e como separadas umas das outras, a fim de serem tidos por duvidosos e incertos, ao passo que de fato estão firmes e constantes, convém, Veneráveis Irmãos, primeiro exibirmos aqui as mesmas doutrinas em um só quadro, e mostrar-lhes o nexo com que formam entre si um só corpo, para depois indagarmos as causas dos erros e prescrevermos os remédios para debelar-lhes os efeitos perniciosos.”

Mesmo com a publicação desta Encíclica o processo de subversão da Igreja continuou e com Pio XII (1939-1958) deu-se o fim da Igreja, tal como ela foi durante vinte séculos. O ecumenismo – “Tudo é um” – e a revolução litúrgica caminham a passos largos rumo à humanização de Deus e a divinização do homem e da natureza.

Com relação ao ecumenismo Chesterton diz algo assim:

“As pessoas não se dão conta de que o mais grave risco que já correu a fé em Jesus Cristo e o risco de desaparecimento da fé cristã sobre a face da Terra, foi corrido num mar de boa acolhida, de boa vontade, de boa disposição, quando, às margens do Adriático, foi oferecido aos cristãos colocar lá sua estátua de Jesus no meio das outras, para ser mais uma entre as outras. Esse foi o mais grave risco que a religião cristã correu de desaparecer, porque foi para não admitir isso que os mártires morreram, que os mártires deram o sangue.”

Diante de tamanha gravidade para a Igreja de Cristo, devemos nos unir em oração suplicando à Imaculada Conceição para que proteja e defenda a Santa Igreja Católica Apostólica Romana dos insidiosos que a subvertem a partir de dentro, corrompidos que foram pelos inimigos externos da Igreja e de Deus. O mal jamais vencerá. Santa Maria, rogai por nós!

Escrito em 27/02/2013

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1 respostas para O ROMANTISMO E O CONCÍLIO VATICANO II

  1. Anonimo disse:

    Muito bom este seu trabalho, parabéns.

    Deus lhe abençoe! Salve Maria;

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